Dreaming of Spilliaert Group exhibition

Apresentação

 

Aberta todos os dias | 11h — 18h

d'Ouwe Kerke
Dorpsstraat 16
4525 AH Retranchement
Holanda

 

Lucas Arruda, Patricia Leite, Kasper Bosmans, Paulo Nimer Pjota, Varda Caivano, Antonio Obá, Guglielmo Castelli,Giangiacomo RossettAdriano Costa, Maaike Schoorel, Lewis Hammond, Paula Siebra, Vojtech Kovarik, Léon Spilliaert,Mimi Lauter e  Pol Taburet.

 

Em Dreaming of Spilliaert, a Mendes Wood DM apresenta a extraordinária produção de Léon Spilliaert (n.1881, Ostend, Bélgica; f.1946, Bruxelas), ao lado de obras criadas por quinze artistas contemporâneos. Exibidos em uma antiga igreja do século XVII em Retranchement, na Holanda, a apenas alguns quilômetros do Mar do Norte, os trabalhos compõem uma exposição trans-histórica que proporciona uma leitura multifacetada das obras em exibição

Poucos artistas belgas permanecem tão ambíguos e influentes quanto Léon Spilliaert. Amplamente reconhecido hoje por suas paisagens terrestres e marítimas sombrias, seus enigmáticos autorretratos e suas sinistras cenas noturnas, o artista ocupa uma posição singular no mundo da arte belga e internacional. A combinação de tendências simbolistas, românticas e expressionistas em um único corpo de trabalho desafia qualquer tipo de categorização e destaca de forma vívida uma sensibilidade tanto existencial quanto universal. Em Dreaming of Spilliaert, a atitude artística e os temas de Spilliaert servem como referência para os artistas contemporâneos selecionados, oferecendo um ponto de partida relevante para a interpretação de seus trabalhos.

Na obra de Spilliaert, revela-se uma relação simbiótica entre a representação de objetos cotidianos aparentemente banais e a tentativa de capturar ou escapar da fragilidade do dia a dia. Em Les Poupées (1931), por exemplo, o olhar ansioso dos bonecos transforma essas figuras inanimadas em uma reflexão pungente sobre a vulnerabilidade humana. O que se torna evidentemente claro nas composições de Spilliaert com bonecos – a maioria delas criada na primeira metade da década de 1930 – é a repetição constante de objetos semelhantes, que serve como uma oportunidade para examinar forma, cor e técnica. Essa serialidade permite uma representação quase automática do tema, o que, por sua vez, abre espaço para explorações psicológicas, algo também presente em suas paisagens. Essas pinturas, que abrangem a maior parte da obra de Spilliaert, são particularmente apreciadas por sua capacidade de evocar uma sensação de melancolia, vazio e inquietação. Esse tema é explorado como uma tentativa de expressar uma ansiedade existencial, derivada tanto da personalidade de Spilliaert quanto das características sociais do início do século XX. Seu estilo gráfico único, com ênfase na linha horizontal, uma paleta de cores quase monocromática e o uso dramático de luz e sombra, é visivelmente marcante em La digue et Kursaal (Ostende) (1909).

A paisagem, enquanto gênero pictórico, é frequentemente utilizada por artistas para expressar ou examinar um estado mental e sua realidade, em vez de simplesmente representar um estado físico. Essa abordagem continua relevante até hoje. Apesar das grandes mudanças nas condições da nossa sociedade contemporânea desde a época de Spilliaert, vários artistas apresentados nesta coletiva se baseiam na rica tradição da pintura de paisagem para explorar as complexidades da condição humana. As pinturas em pequena escala de Lucas Arruda, por exemplo, são composições meditativas nas quais a paisagem retratada pode ser vista como um registro mnemônico com ressonância emocional. Embora executada com técnicas diferentes e mais de cem anos depois, a paisagem de Arruda ecoa, de maneira poderosa, uma atmosfera semelhante à de Marine (1900) de Spilliaert, uma obra singular e inicial do artista. Da mesma forma, Vulto (2024) de Paula Siebra oferece um humor mental transitório. Suas representações da vida cotidiana, criadas com estratégias formais surpreendentemente similares às de Spilliaert — como o uso de tons monocromáticos — proporcionam uma profunda sensação de tranquilidade e introspecção.

Embora Spilliaert tenha trabalhado principalmente em papel, ele produziu cerca de cinquenta obras em óleo sobre tela, a maioria entre 1920 e 1926. Um exemplo notável é Arbres au crépuscule (1924), na qual o artista consegue traduzir suas caminhadas noturnas em uma paisagem florestal atmosférica. Esse ambiente intrigante também pode ser encontrado em Karaoke (2024) de Pol Taburet e em Coarse Salt (2024) de Guglielmo Castelli, onde figuras nebulosas vagueiam pelo plano da imagem. Em contraste, Patricia Leite oferece ao espectador uma imagem mais pastoral, que ela descreve como “sensações de paisagem”. Essas manifestações íntimas podem ser vistas como reflexões semelhantes a um diário de sua vida cotidiana, remetendo ao idílico Bateau de pêcheur porté par les vagues(1912–1913) de Spilliaert. Inspirada pelo tempo que passa em seu próprio jardim, Mimi Lauter apresenta uma composição mais abstrata, colorida e vívida. Em sua abordagem, a paisagem representa o potencial da vida.

A busca pelo eu, ou mais especificamente pela sua representação externa, resultou em algumas das obras mais evocativas e, às vezes, inquietantes de Spilliaert. Por meio dessas imagens, o artista expressou seu próprio senso de fragilidade e alienação. Embora não sejam necessariamente autorretratos, as imagens pintadas por Lewis Hammond apresentam uma representação igualmente íntima, porém alienante, de figuras. Da mesma forma, Sentinela III: A noiva (2024) de Antonio Obá lembra alguns dos poderosos e perturbadores retratos de Spilliaert. A (auto)representação, seja na forma de retratar a própria imagem física ou na construção de uma identidade por meio de referências simbólicas, é uma preocupação comum entre vários dos artistas presentes na exposição. Ao se inserir em composições históricas, Giangiacomo Rossetti, por exemplo, reivindica não apenas as pinturas referenciadas, mas também a percepção de sua própria imagem. Em contraste, Kasper Bosmans usa um vasto repertório de referências simbólicas para criar sua narrativa artística. Seu trabalho está em constante expansão, começando pelo pessoal e ressoando de forma universal, oferecendo, em troca, uma visão sobre a identidade do artista. Dessa forma, fica cada vez mais evidente o caráter universal da obra de Léon Spilliaert. A exploração da condição humana através de representações paisagísticas, juntamente com a análise da identidade e sua construção por meio da representação, oferece uma chave para interpretar as práticas artísticas diversas e únicas presentes em Dreaming of Spilliaert.

— Jef Declercq

Obras
Vistas da exposição